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ANTIDEPRESSIVOS VERSUS AUTOCONHECIMENTO

WALDEMAR MAGALDI FILHO


Nos últimos dias estão sendo veiculadas inúmeras matérias a respeito do lançamento de novos medicamentos que podem melhorar o nosso humor. Remédios antidepressivos capazes de nos deixar livres de qualquer tipo de vício além de propiciarem sentimentos de felicidade e paz! É evidente que em nossa sociedade, aonde a dificuldade de sobrevivência cada vez mais brutaliza e estressa o ser humano, notícias como essas são muito bem vindas.
De fato, muitas empresas farmacêuticas estão investindo pesadamente neste segmento, que é altamente rentável e atinge mais de 40% da população mundial. Porém, é importante lembrarmos que há exatamente 20 anos o lançamento da fluoxetine (princípio ativo do Prozac) provocou as mesmas reações eufóricas. Mas, infelizmente, apesar do consumo exagerado deste e de outros antidepressivos ou estabilizantes de humor de última geração, os problemas emocionais continuam crescendo e provocando muitos danos tanto relacionais quanto orgânicos.
Não podemos “terceirizar” a responsabilidade que devemos ter com a nossa felicidade. A felicidade não pode vir por meio de coisas externas, pois a verdadeira e perene felicidade só pode acontecer na jornada do autoconhecimento e do encontro de sentido e significado existencial. Nem o dinheiro pode ser instrumento para se atingir a felicidade, pois feliz é quem gosta de viver e tem fé na própria vida, independente dos percalços tristes que possam atingi-lo.
A meu ver a felicidade é o resultado da conquista das experiências de plenitude, liberdade e amor próprio. Pois só quem consegue se livrar dos desejos e das esperanças é que pode se entregar para o agora e experimentar o presente do presente, ou seja, a vida fluindo evolutivamente na amorosidade divina, apesar de todas as situações adversas. Sempre afirmo que a felicidade só pode surgir pela aquisição do autoconhecimento, que depois de alcançado jamais é perdido, pois passamos a perceber os estados de alegria ou tristeza, prazer ou dor, nascimento ou morte, como eventos transitórios, inerentes a vida e a diversidade da nossa existência.
O sentimento de plenitude surge quando podemos estar satisfeitos e desfrutar o que temos e somos, obviamente sem abrir mão dos planos e do compromisso evolutivo. O de liberdade acontece quando compreendemos que o amor jamais irá aprisionar e nos libertamos dos apegos e dos desejos egóicos, que são mundanos e muito diferente das necessidades instintivas e da vontade do Self ou chamado existencial, que dá sentido e significado para a vida. E o de amor próprio que é atingido pelo reconhecimento e cura das feridas narcísicas, onde passamos a nos compreender como seres em evolução.
O medicamento pode ser um instrumento momentâneo para quem está sofrendo e não está conseguindo se libertar dos pensamentos e emoções destrutivas. Hoje nós sabemos que existe uma estreita relação entre a emoção e a bioquímica corporal e, neste caso, a medicação pode, de fora para dentro, tentar restabelecer o equilíbrio. Porém, se não houver uma mudança no padrão de crenças e de pensamentos, o organismo vai criando resistência ao remédio e todos os sintomas reaparecem. Nesse momento é que os novos produtos, que obviamente são mais caros, substituirão os antigos e a cura, infelizmente, fica de lado, porque o tratamento fica limitado à dimensão bioquímica das emoções, deixando a subjetividade do ser.
As emoções produzem mudanças químicas, principalmente no equilíbrio dopaminégico. A dopamina é um mensageiro químico que estimula os centros cerebrais de prazer e satisfação, capaz de alterar o humor. As sinapses são as ligações que acontecem entre os neurônios, que são as células cerebrais. Quanto mais rede sináptica mais maduro e eficiente é o cérebro. As sinapses excitadoras aumentam o fluxo de substâncias químicas, como a dopamina, associada ao sentimento de euforia, enquanto as sinapses inibidoras impedem estes fluxos. Ambas são importantes para a homeostase neuropsíquica. 
É importante saber que qualquer célula é uma pequena unidade de consciência que age exclusivamente dentro dos princípios de sobrevivência biológica e de sua especificidade. Com isso, cada célula aprende com as experiências de gratificação e recompensa, além de transmitir para sua descendência esse aprendizado. Então, as novas células serão muito mais capacitadas para a realidade bioquímica, equivalente ao ambiente emocional mais dominante da pessoa, com o aumento ou a ativação dos receptores da bioquímica mais disponível. O cérebro, por sua vez, é formado por células muito mais específicas para formar rede de relacionamento e informação. Desta forma, os antidepressivos são substancias que interferem quimicamente no sistema de recompensas.
O tratamento baseado exclusivamente aos aspectos físico-químicos ou comportamentais da depressão se restringirá à exterioridade adaptativa do paciente. Mas, na maioria das vezes, fica limitado da compreensão do significado emocional do sintoma, incluindo as vivências individuais, familiares, socioculturais e espirituais presentes na vida do depressivo, e o papel que essas vivencias produziram no desenvolvimento da personalidade e da cultura. Principalmente porque acredito que é por meio da atribuição de significados simbólicos aos sintomas de adoecimento que poderemos compreender a alma humana, estudar o sistema nervoso e o funcionamento dos neurotransmissores.
A Psicologia junguiana é uma abordagem psicanalítica que irá estimular o processo de elaboração simbólica, com intuito de ampliar a consciência de si mesmo, o Self, como o centro e a finalidade última de toda a atividade vital. Esse processo se dá a partir da conscientização das personas, as máscaras sociais e os personagens atuantes em cada indivíduo. Com a percepção consciente da persona imediatamente vão surgindo os aspectos sombrios e toda história evolutiva do ser e da humanidade, estruturados no quatérnio arquetípico – matriarcal, patriarcal, de alteridade e de totalidade. Esses quatro dinamismos, por sua vez, operam através da atividade criativa e centralizadora do arquétipo central.
Concluo deixando claro que depressão é sinônimo de negação de vida. Vida, por sua vez, depende das relações e das trocas. Por isso é muito importante entendermos que depressão não é sinônimo de tristeza. A tristeza é oposta da alegria e a depressão é oposta da felicidade. Uma pessoa que conquistou a felicidade, por ter encontrado um sentido e o significado da sua vida, saberá lidar tanto com os momentos de tristeza, sem cair em depressão, quanto com os de alegria, sem pender para a euforia ou mania. Ou seja, a felicidade é um estado de espírito que, depois de conquistado poderá ser perene, apesar das oscilações naturais da vida. E que a felicidade é uma conquista consciente daquele que teve a coragem de se enfrentar num processo de autoconhecimento, encarando as personas, a sombra e o inconsciente.
Nesse sentido que publiquei o livro: “Dinheiro, saúde e Sagrado”, com o intuito de promover a reflexão sobre essas situações contemporâneas que abrangem tanto a medicina quanto as religiões, facilitando o autoconhecimento e o alcance da cura que é muito mais abrangente do que a supressão dos sintomas. 


WALDEMAR MAGALDI FILHO (Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.) é psicólogo, especialista em Psicologia Junguiana, Psicossomática e Homeopatia. Autor do livro: “DINHEIRO, SAÚDE E SAGRADO – interfaces culturais, econômicas e religiosas à luz da psicologia analítica”. Mestre e doutor em Ciências da Religião, que atuou tanto no meio corporativo de empresas multinacionais quanto no comércio varejista. Atualmente, atende clientes em seu consultório, apresenta palestras em empresas, coordena e ministra aulas nos cursos de Psicologia Junguiana; Psicossomática E Dependências, Abusos e compulsões na FACIS - Faculdade de Ciências da Saúde de São Paulo. Site:
www.ijep.com.br